Revista Sobrado
Foto: Arquivo pessoal

Mulheres usam o Instagram para compartilhar conteúdo literário

De acordo com a quarta e mais recente edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, promovida pelo Instituto Pró-Livro, lançada em 2016, o Nordeste é a segunda região com mais leitores do Brasil, ficando atrás apenas do Sudeste. A pesquisa é divulgada a cada quatro anos, a próxima será lançada ainda este. Tanto na quarta edição, quanto na terceira pesquisa, o Nordeste tem 28% de leitores dentro de uma amostra de quase 188 milhões pessoas estudadas.

A tecnologia sempre avança, o uso das redes sociais tem possibilitado prazeres e desprazeres. Nessa atmosfera digital, existem muitas pessoas dispostas a garantir um conteúdo leve, fluido e, acima de tudo, verdadeiro aos seus smeguidores. Com uma facilidade no nível de engajamento (em ganhar seguidores e ter suas publicações compartilhadas e vistas), o Instagram é o novo queridinho dos produtores de conteúdo. Segundo o Social Media Trends 2019, da Rock Content, o aplicativo aparece como a rede social mais utilizada dentre o brasileiros. São 92,5% de um total de 140 milhões de usuários de redes sociais digitais no país.

No âmbito nacional, conforme aponta a mais recente edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, a maioria são leitoras, contabilizando 52% da amostra, com uma média de 35 anos de idade. A Revista Sobrado decidiu então trazer três visões de perfis literários de mulheres – baianas, nordestinas e arretadas – que indicam não apenas livros dentro do Instagram, mas uma gama de elementos culturais como dicas de filmes e suas rotinas.

Incentivo à leitura
Ana Paula Bispo é um exemplo de quem se apaixonou por leitura ainda cedo. A jornalista soteropolitana conta que tudo começou com os gibis da Turma da Mônica – uma porta de entrada para muitas crianças – que a mãe comprava para ela e para os irmãos. Mas a ideia de criar um perfil para compartilhar sua aventura literária só surgiu no último ano da faculdade, quando preparava o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em 2018. “Falei sobre biblioteca comunitária e incentivo à leitura. Procurei uma forma de usar a minha bagagem sobre o assunto, usando o Instagram como uma ferramenta que me identifiquei”, relembra.

A dona do perfil @soteroleitora compartilha dicas de livros, séries, filmes, além de mostrar as próprias leituras diariamente nos stories para seus seguidores. “Geralmente, no início do mês eu faço um calendário com algumas postagens que quero fazer. Tenho um caderno onde anoto as ideias de temas. Gosto de trazer meu dia a dia, divulgar eventos e promoções, divulgar outros perfis”, conta.

Ana Paula mediando uma roda de leitura com crianças / Foto: Arquivo pessoal

A relação de Ana Paula com os livros ultrapassou a barreira da faculdade e do gosto pessoal, a partir do momento que ela começou a trabalhar em duas bibliotecas comunitárias, se dividindo entre os bairros da Fazenda Grande do Retiro e do Vale dos Lagos. “Nós trabalhávamos com crianças e adolescentes ali nos arredores dos bairros, das escolas comunitárias, que estão em situação de vulnerabilidade social, que estudam em escola pública e que as famílias precisam de ajuda para sobreviver”, comenta.

A realidade das crianças de bairros carentes supera, infelizmente, as barreiras de dificuldade financeiras, por exemplo. A jornalista relata que, enquanto trabalhava com elas no projeto, notava que mal sabiam escrever o próprio nome, e a roda de leitura era o momento ideal para apresentar o universo fantasioso dos livros. “Como temos um acervo bem completo, a gente tinha ferramentas para incentivá-los. A mediação era uma forma de criar esse contato, vínculo com o livro”, explica.

Em seu perfil, Ana mostra, quase que diariamente, as mudanças em sua estante, com livros novos e usados, enaltecendo a cultura de trocas e ida a sebos. “É uma forma de facilitar o acesso a livros. Estou sempre doando para bibliotecas ou para pessoas que sei que não têm como adquirir livros por questões financeiras”,pontua.

Elaine e Thais em uma livraria / Foto: Arquivo pessoal

Compartilhamento de textos
As também jornalistas e amigas Elaine Lima e Thais Queiroz, decidiram, no final de 2014, quando ainda estavam na faculdade, criar um perfil para compartilhar seus romances e textos favoritos para quase 7 mil seguidores. “Foi bem orgânico. Um dia decidimos criar um blog e depois migramos para o Instagram. É um processo muito bom, pois a gente encara o Jornalizando como uma válvula de escape e uma forma de transbordar todo esse amor pela leitura que até então ficava em nossos corações”, conta Thais.

Thais, a soteropolitana de 23 anos, que além de jornalista está fazendo curso superior de Tecnologia em Marketing, relembra que o gosto pelas palavras começou desde cedo, mas começou a ler com mais frequência no início do ensino médio. “O meu contato com a literatura era quase que exclusivamente com as obras obrigatórias das escolas, o que me fez fugir um pouco desse universo, pois eu achava muito desgastante e muitas vezes não entendia nada. Aí no ensino médio descobri Rick Riordan – autor da famosa saga de Percy Jackson – e me apaixonei de vez”, conta.

Elaine, a outra dona do perfil, jornalista e graduanda em publicidade, também teve o pontapé inicial na infância. Ela conta que, por ter sido alfabetizada muito cedo, foi incentivada pela mãe. Hoje, a também soteropolitana adora livros de romance e escreve resenhas de seus favoritos. “Vale ressaltar que não conto spoiler nas resenhas, acho importante”, brinca.

Por dividirem a rotina de criação de conteúdo com trabalho e estudo, ambas ainda encaram o perfil como hobby, mas assumem que já se profissionalizaram um pouco. “Não temos lucro, monetariamente falando, no momento. Começamos a implementar o link da Amazon, mas ainda está no processo inicial, e todo valor que vier, iremos utilizar para comprar livros e sortear. Mas o lucro que temos com toda certeza acredito que é cultural e também a quantidade de gente massa que encontramos. Tem muita gente legal nesse meio de ig literário e a experiência é fantástica”, diz Thais.

Mariana Martinez em seu quarto / Foto: Arquivo pessoal

Leitura na pandemia
E será que teve gente que decidiu compartilhar suas leituras agora no período da pandemia? A resposta é sim, e foi a estudante de odontologia, Mariana Martinez, 23 anos, que se viu angustiada com notícias e conteúdos sobre o novo coronavírus invadindo as redes sociais e a televisão. Então, em meio ao caos, decidiu resgatar o hábito da leitura e compartilhar um perfil no Instagram.

“Fiquei num hiato na leitura no período de pré-vestibular e faculdade. Decidi assinar um clube de leitura da internet e recebi o primeiro livro. Me empolguei e comecei a comprar mais. Era o que eu tava precisando para embalar de novo. Percebi que é um hábito que não quero perder mais”, desabafa.

A rotina para uma produtora de conteúdo digital é fundamental e, segundo Mariana, as postagens são preparadas semanalmente. “Geralmente organizo minha semana inteira no domingo, inclusive as postagens que quero fazer. Uso uma plataforma do Facebook chamada Estúdio de Criação, onde programo todas as legendas e depois faço as fotos e já organizo por lá. No dia é só publicar”, explica.

Por estar sem aulas, tem interagido bastante com seguidores e com outros criadores de conteúdo. “Tenho muito mais tempo disponível. No início eu ficava muito ‘nossa, quero fazer um post que, no meio de tanta confusão, as pessoas sintam o coração quentinho’. Querer fazer as pessoas felizes, me ajudou. O sentimento ficou mais aflorado”, declara a estudante.