Revista Sobrado
Foto: Divulgação

Rodrigo de Roure estreia na literatura com o romance ‘Os Bugres’

Em meio à mudança de Estado e início da pandemia do novo coronavírus, o autor Rodrigo de Roure estava nos últimos ajustes para lançar o romance Os Bugres, após um ciclo de quatro anos de produção. Esse é o primeiro romance do carioca, que atualmente mora na capital baiana. Antes de chegar às livrarias, Os Bugres pode ser adquirido no site da editora Urutau.

A obra tem como cenário o subúrbio do Rio de Janeiro, buscando fugir do protagonismo dos cartões postais. O foco é na engrenagem, na população que faz o cartão postal aparecer. O romance reflete temas como religiosidade e festas populares. Propõe uma reflexão não apenas do cotidiano paralelo da “cidade maravilhosa”, mas também sobre o Brasil – o Brasil de agora.

Em entrevista à Sobrado, o autor contou como foi o processo de criação do livro. “Tive a ideia para esse livro há muitos anos. Desde criança eu sou de Terreiro, observando as mulheres de Terreiro, notei que tinha muitas histórias e em 2009 resolvi escrevê-las. São histórias das mulheres que me criavam”, disse. “É uma experiência de vida. O subúrbio do Rio termina sendo uma estética no livro, mas é a base de onde eu olho o mundo, nasci e fui criado no subúrbio”, acrescenta.

Rodrigo começou a escrever Os Bugres em outubro 2015 e lembra que a última e definitiva revisão foi quando chegou em Salvador, em março de 2020, no começo da pandemia, quando estava tudo fechando. “Aí, a última revisão, antes de mandar para a editora, fiz aqui”, lembra.

Termo pejorativo
O termo ‘bugre’ é pejorativo e preconceituoso. Usado pelos europeus colonizadores, fora atribuído a alguns indígenas por serem vistos como mais selvagens, rudes, incivilizados e – o que interessava bastante ao olhar colonizador – hereges. Com o passar dos anos esse temo continuou pejorativo, mas usado para denominar a população de baixa renda.

A escolha pelo nome é um tanto irônica, revela Rodrigo. “O livro foi criado no Rio invisibilizado, no Subúrbio carioca. Os bugres são essas pessoas. Digo sempre que os personagens do livro são os bastardos da pátria. Usei o termo pejorativo no livro, colocando todo o sentido ruim, mas tentando subverter isso”, conta.

O livro foi criado no Rio invisibilizado, no Subúrbio carioca. Os bugres são essas pessoas. Digo sempre que os personagens do livro são os bastardos da pátria

Rodrigo de Roure, escritor

A história é contada por um narrador que frequenta todos os ambientes: bares; festas; terreiros de bairros atravessados pela linha férrea da Central do Brasil. Na conversa com a Sobrado, o autor pontuou que “o narrador é um fofoqueiro”. É nesse ambiente que o narrador tece uma rede invisível, revelando o cotidiano de mães e pais de santo, costureiras, jornaleiros, diaristas, funcionárias públicas, médicos e toda uma série de personagens.

Relação com a Bahia
Além de ter começado o livro no Rio de Janeiro e ter feito o último ajuste em solos baianos, a relação com a Bahia se mostra presente também nas páginas do livro.

Bisneto, neto e sobrinho de mulheres baianas, de Roure se inspirou em algumas delas na construção de personagens de Os Bugres, criando um núcleo inteiro de mulheres que trocam a cidade alta, em Salvador, pelo bairro de Piedade, no subúrbio do Rio, em meados dos anos de 1940, em pleno carnaval.

O contexto histórico da obra é atravessado pelo tempo e suas referências, envolvendo um período que começa na chegada da luz elétrica, no início do século XX, até a morte da cantora Clara Nunes, na década de 1980.

Além de escritor, Rodrigo de Roure é dramaturgo e ator de formação. Seu primeiro texto, a novela Senhora Coisa, adaptada para monólogo, foi encenada no Rio de Janeiro. Em 2003, ele escreveu o seu segundo monólogo, Os últimos dias de Gilda (encenado em 2004 e em 2018, também no RJ). Com o monólogo Inferno (encenado em 2019 no RJ e em 2020-21, em Salvador, com a atriz baiana Ana Paula Bouzas), escrito em parceria com Luiz Felipe Andrade, ele encerraria sua trilogia de mulheres confinadas.

Rodrigo disso que os trabalhos não param. A Sobrado quis saber se a capital baiana tem o inspirado para novos projetos. “Estou escrevendo um romance sobre o corpo LGBT no subúrbio do RJ, uma criança viada. O próximo é a história de Olga, a adivinha de Os Bugres, antes de ir pra o Rio. Quero sondar mais sobre esse pedaço de mim que tem aqui na Bahia”, encerra.

Foto: Capa de ‘Os Bugres’ / Divulgação