Revista Sobrado
Foto: Divulgação

Cine Glauber Rocha reabre com a 17ª edição do Panorama Internacional Coisa de Cinema

No dia 16 de setembro último, fomos surpreendidos com a nota divulgada pelo banco Itaú anunciando o fechamento do Cine Glauber Rocha, um complexo cultural, que virou um patrimônio cultural de Salvador, que ajudou a revitalizar o Centro Histórico da capital baiana. A Sobrado publicou um editorial em defesa da permanência e existência do Cine Glauber Rocha, que há mais de 100 anos atua como um agente vivo e pulsante da cultura e das artes no coração de Salvador.

A notícia do encerramento do contrato de patrocínio do banco Itaú gerou um importante debate e uma mobilização para que o Cine Glauber Rocha não fechasse as portas. E deu certo. Um novo patrocinador apareceu e agora as portas do complexo cultural serão abertas ao público de maneira grandiosa, apresentando a 17ª edição o Panorama Internacional Coisa de Cinema.

“Já são dois anos sem a realização do Panorama, sem presença do público. São dois anos muitos difíceis. São dois anos de muitas perdas. Quase todos nós perdemos alguém próximo. Quando olhamos para o lado cultural, muitos espaços culturais e festivais desapareceram, não conseguiram permanecer. Quase que nosso cinema e o Panorama também desapareceram. Por isso, vamos comemorar a permanência do Cine Glauber Rocha e a realização presencial do Panorama. Isso é importante para muita gente”, declara Cláudio Marques, diretor do Cine Glauber Rocha, idealizador e um dos coordenadores do Panorama.

Vamos comemorar a permanência do Cine Glauber Rocha e a realização presencial do Panorama. Isso é importante para muita gente

CLÁUDIO MARQUES, diretor do Cine Glauber Rocha

“Temos cicatrizes, mas estou emocionado com o dia de hoje. Tem um desejo de que as coisas continuem, tenham sequências. Foi esse desejo que levou que o Grupo Metha e o Instituto Flávia Abubakir nos procurassem com um gesto de disponibilidade que nunca vi. É muito gratificante ver o setor privado perceber sua importância em manter a cultura viva. A cultura é frágil e precisa dessa união”, ressalta Cláudio Marques.

Reforma
O Cine Glauber Rocha, desde setembro, vem passando por uma ampla reforma. Todo o sistema de ar condicionado foi substituído, o sistema de som e projetor foi calibrado, todas as paredes estão sendo pintadas.

“É uma ópera bonita, muitas pessoas trabalhando juntas. Seguimos ainda com a reforma, por isso, estamos encarando o Panorama como uma pré-abertura. Estamos muitos felizes com a retomada do cinema, com a realização do Panorama, com os filmes que vamos exibir”, comemora Cláudio Marques.

Durante o Panorama Internacional Coisa de Cinema apenas duas salas de cinema serão usadas. “A reforma seguirá mesmo durante o evento. A abertura das 4 salas será realizada apenas no próximo dia 9”, revela o diretor do Cine Glauber Rocha.

Abertura do Panorama
De 1º a 8 de dezembro, cerca de 80 filmes serão exibidos no Panorama Internacional Coisa de Cinema com sessões presenciais e on-line (panorama.coisadecinema.com.br), que contará também com  oficinas e debates. A organização do evento reforça que serão adotados todos os protocolos vigentes de prevenção da Covid-19.

As obras selecionadas serão exibidas nas competitivas Nacional, Baiana e Internacional, em mostras paralelas e nas sessões de abertura e encerramento. A abertura será hoje (1/12), com acesso gratuito, e contará com a apresentação Maestro Ubiratan Marques & Convidados, com participação especial de Mariella Santiago, e a exibição do clássico Deus e o diabo na terra do sol (1964). As demais sessões presenciais e on-line terão preço único de R$ 5.

O filme será exibido às 20h10, com retirada de ingressos a partir das 17h, na bilheteria do cinema. No mesmo horário, o acesso à obra será liberado gratuitamente no site.

O longa-metragem do diretor baiano Glauber Rocha lança um olhar sobre vários tipos de opressão. Foi escolhido por evidenciar o cinema como veículo e objeto de resistência. A rosácea da fachada do Cine Metha – Glauber Rocha foi desenvolvida por Rogério Duarte para a identidade visual do filme. “É um símbolo do cinema brasileiro, de sua força e importância”, afirma Marília Hughes, coordenadora do Panorama.

A primeira Competitiva Nacional também integra a programação de abertura, com exibição do documentário Edna, de Eryk Rocha, cuja personagem homônima é uma testemunha do arruinamento de terras na Amazônia brasileira.

A sessão tem ainda os curtas Como Respirar Fora D’água, de Júlia Fávero e Victoria Negreiros, e Eu Espero o Dia da Nossa Independência, de Brunna Laboissiére e Bruna Carvalho Almeida.

Já o encerramento, no dia 8, terá uma homenagem ao centenário do sambista baiano Riachão, morto em março do ano passado. Jorge Alfredo apresentará o documentário Samba Riachão, dirigido por ele há 20 anos, em horário a definir. O diretor conversará com o público ao final da sessão.

Competitivas
“São muitos filmes que são enviados para a seleção. Eu assisti cerca de 120. Muitos ficaram de foram quando montamos a grade de exibição. Fico feliz com a quantidade enviada para a seleção das competitivas, o que mostra o momento forte do cinema brasileiro. Uma safra motivadora”, pontua Cláudio Marques, que integra a equipe de pessoas que cuida da curadoria da competitiva nacional.

Fico feliz com a quantidade enviada para a seleção das competitivas, o que mostra o momento forte do cinema brasileiro. Uma safra motivadora

CLÁUDIO MARQUES, integrante da curadoria da competitiva nacional

Entre os longas que integram a Competitiva Nacional está “A matéria noturna” (RJ), de Bernard Lessa, premiado como obra em finalização no 52º Festival de Brasília. O filme explora as possibilidades geradas do encontro entre uma jovem de Vitória (ES) e um marinheiro moçambicano. O primeiro longa de Madiano Marcheti, “Madalena” (MT/RJ), levou ao Festival de Roterdã os impactos do desaparecimento de Madalena na vida de três pessoas que não se conhecem.

O novo documentário de Eryk Rocha é um dos destaques da mostra. Filmado em preto e branco, “Edna” (SP) apresenta a personagem homônima, uma testemunha do arruinamento das terras em torno da rodovia Transbrasiliana, na Amazônia brasileira. A competitiva traz também a produção baiana “Receba!”, de Pedro Perazzo e Rodrigo Luna, uma ficção que reúne tipos diversos na busca por uma bolsa com conteúdo ilegal e valioso.

Fechando a lista de oito selecionados estão “A felicidade das coisas (SP), de Thais Fujinaga; “Mata” (Brasil/Noruega), de Fábio Nascimento e Ingrid Fadnes; “Os ossos da saudade” (MG), de Marcos Pimentel; e “5 Casas” (RS), de Bruno Gularte Barreto. A mostra tem ainda dezessete curtas-metragens, que serão exibidos aos pares, ou em trio, antecedendo os longas-metragens.

Na Competitiva Baiana, 25 filmes de diferentes formatos, gêneros e estilos, oferecem um cenário do cinema realizado nos últimos dois anos. A mostra é composta por 20 curtas e os longas “Açucena” (Isaac Donato), “Àkàrà no fogo da intolerância” (Claudia Chávez), “Genocídio e movimentos” (Andreia Beatriz, Hamilton Borges dos Santos e Luis Carlos de Alencar), “Nós” (Letícia Simões) e “Qual a cor do trem?” (Rodrigo Carvalho e Deniere Rocha).

Fechando as competitivas, a Internacional reúne seis longas e 12 curtas produzidos em 26 países dos cinco continentes, trazendo a Salvador filmes inéditos de lugares como Nova Zelândia, Romênia, Burkina-Faso, Síria, Alemanha e Chile. Premiado no Festival Internacional de Documentários de Amsterdã (IDFA), “Esta chuva nunca vai parar (This Rain Will Never Stop)”, coprodução Ucrânia/Iraque/Síria/Alemanha, dirigido por Alina Gorlova, estará na mostra. Essa competitiva acontecerá apenas no formato on-line.

Especiais
Os cineastas John Carpenter e Alain Gomis serão homenageados no festival, com a exibição de três filmes realizados por Carpenter entre 1978 e 1987 e duas obras de Gomis lançadas na década de 2010. A mostra Alain Gomis será realizada com apoio cultural do Consulado Geral da França. O Panorama inclui ainda sessões especiais com “Deus tem Aids”, de Gustavo Vinagre, e “NŨHŨ YÃG MŨ YÕG HÃM: Essa Terra é Nossa!”, de Isael Maxakali, Sueli Maxakali, Carolina Canguçu e Roberto Romero.

As sessões especiais e as mostras-homenagem irão acontecer apenas presencialmente, assim como o lançamento do livro “Pó da estrada: escritos de João Carlos Sampaio”, publicação organizada por Tais Bichara e Flávia Santana, com curadoria de críticas de João Paulo Barreto e Rafael Carvalho. Falecido em 2014, João Carlos foi o primeiro a ministrar oficinas de crítica no Panorama.

Nesta edição, a oficina de Crítica de Cinema será mantida no formato on-line e ministrada pela vice-presidente da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), Amanda Aouad. O modelo virtual também permanece nos laboratórios de roteiro e montagem. As três atividades têm acesso gratuito e seus participantes já foram selecionados.