Revista Sobrado
Arte: Yago Vieira / @yagoquefez

Em cima dessas rodas também bate um coração

Desde 2017, a União Brasileira de Compositores (UBC) realiza uma cerimônia anual em homenagem a personalidades que representem a arte da composição. Em sua primeira edição, o Prêmio UBC foi destinado a Gilberto Gil, sucedido por Erasmo Carlos no ano seguinte e por Milton Nascimento em 2019. Desta vez, a entidade decidiu reverenciar um artista que, embora não tenha o tempo de vida e de carreira de Gil, Erasmo e Milton, traz consigo uma trajetória musical e pessoal merecedora e digna de ser celebrada e reconhecida. Por mais que ele pense, que sinta e que fale, Herbert Lemos de Souza Vianna ainda tem sempre alguma coisa por dizer.

Em razão da pandemia, toda a programação referente ao Prêmio UBC 2020 aconteceu de maneira virtual. Entre os dias 1º e 9 de outubro, a curadoria do evento promoveu uma exposição de fotos, lives e bate-papos pelo Instagram, além de uma  retrospectiva da carreira de Herbert – que, ao longo de quase 40 anos de estrada, acumula 245 músicas registradas na UBC. O ponto alto da celebração ficou por conta dos depoimentos gravados por dezenas de admiradores, dentre nomes consagrados na música brasileira, intérpretes de canções de sua autoria, contemporâneos do pop/rock e ainda artistas da nova geração. E claro: os Paralamas.

Afinal, se hoje Herbert Vianna é premiado pelo conjunto da obra que (literalmente) escreveu, nada disso seria possível sem a parceria, a amizade e a conexão musical com João Barone e Bi Ribeiro – respectivamente, baterista e baixista daquele que é o mais sólido e duradouro grupo de rock nacional. Diferentemente de outras bandas brasileiras que nasceram naquela explosão roqueira dos anos 80 e se desintegraram ao longo do tempo, Os Paralamas do Sucesso continuam na ativa. E com um legado notório e uma discografia respeitada, responsáveis por fazer de Herbert um dos mais importantes e influentes artistas do país. Não era para menos.

Um cara compulsivo em fazer música, em se aprimorar cada vez mais no exercício de fazer música

Dado Villa-Lobos, em depoimento ao documentário “Herbert de Perto”, de 2009

Esse exercício originou clássicos que percorrem o inconsciente coletivo desde 1983. Não há quem cante “Eu quis dizer…” sem que automaticamente complemente com “…você não quis escutar”. Esse é o poder das criações que impregnam na memória afetiva, rompe as fronteiras das preferências musicais e ultrapassa gerações. Essa compulsão resultou em pérolas sentimentais do naipe de Aonde Quer Que Eu Vá, Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim e A Lua Que Eu Te Dei. Fazer música é também se comunicar politicamente, como ele tão bem fez em Alagados, O Calibre, O Beco e Selvagem, que ainda permanecem tão pertinentes.

Ser Herbert Vianna a pessoa a receber o Prêmio UBC justamente este ano, quando a população mundial está sendo obrigada a ser resiliente diante das adversidades causadas pelo coronavírus, tem um simbolismo ainda maior. Por ser alguém que entende perfeitamente sobre isso, diante da tragédia que o acometeu em 2001 e resultou não apenas na perda dos movimentos das pernas, mas também da sua esposa e mãe de seus filhos. Ao reabilitar-se física, emocional e artisticamente, a figura de Herbert mostra ao mundo pós-pandemia que sim: há uma luz no túnel dos desesperados, há um cais de porto pra quem precisa chegar.

Dica da Sobrado
Além dos mais de vinte discos lançados junto aos Paralamas – entre álbuns de estúdio, trabalhos ao vivo e coletâneas –, Herbert também gravou quatro discos solo: Ê Batumaré (1992), Santorini Blues (1997), O Som do Sim (2000) e Victoria (2012). Agora, seu quinto projeto solo está a caminho. HV Sessions – Vol. 1 reunirá 10 canções não daquilo que ele escreveu, mas do que ele ouviu do rock internacional produzido entre 1964 e 1981, servindo de inspiração e influência para a sua bagagem como cantor, guitarrista e compositor. O álbum chegará aos serviços de streaming no próximo dia 23 de outubro. Confira o faixa a faixa:

01 – Pinball Wizard (The Who)
02 – While My Guitar Gentle Weeps (The Beatles)
03 – Tempted (Squeeze)
04 – Purple Haze (Jimi Hendrix)
05 – And I Love Her (The Beatles)
06 – Opportunity (Elvis Costello)
07 – There Is A Kind Of Hush (Carpenters )
08 – Wichita Line Man (Glen Campbell)
09 – Sunshine Of Your Love (Cream)
10 – Europa (Santana)


JOÃO CAMILO é jornalista e Técnico-Administrativo no Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT). Nascido em Aracaju (SE), já morou na Bahia e hoje reside em Brasília. Apaixonado desde sempre por música e pelo Palmeiras, e desde 2018 também pelo sobrinho Cauã.