Revista Sobrado
Arte: Yago Vieira / @yagoquefez

Um vislumbre da Cidade do Salvador no século XVII

A belíssima gravura retratando Salvador depois da invasão holandesa de 1624, aqui em uma versão colorizada, está na obra De Nieuwe en Onbekende Weereld: Of Beschryving van America en ’t Zuid-land de 1671 (O novo e desconhecido mundo: Ou descrição da América e da terra do Sul) do holandês Arnoldus Montanus (1625 – 1683), editada por Jacob van Meurs. A obra possibilita um passeio na Cidade do Salvador na primeira metade do século XVII.

Gravura do holandês Arnoldus Montanus

Reparem nos traçados do primeiro plano, de imediato observamos uma grande nau acompanhada de quatro pequenas embarcações tripuladas. A dimensão e o ângulo da nau, juntamente com os personagens dos barcos menores, passam uma ideia de profundidade e vivacidade na gravura, como se tivéssemos indo em direção a Cidade do Salvador. A região do porto, local de chegada e saída de pessoas, ideias e mercadorias, está sempre movimentada, não podemos esquecer o intenso fluxo da área portuária.

Salvador surge logo em seguida destacando-se a Cidade Baixa e Alta em uma perspectiva ampla das duas regiões, como se tivéssemos sobrevoando. Olhem os personagens inseridos no porto e do lado direito um enfileiramento de alguma tropa. Subindo pelas ladeiras no meio da escarpa, um lamaçal na época de chuva com muitos desmoronamentos, chegamos ao núcleo central da capital, reparem nas quintas na parte interna dos quarteirões. No além muro, novamente temos como destaque o dique e seu entorno com hortas e vegetação com uma ou outra construção no entorno. Baía de Todos os Santos e o Dique ofereciam uma proteção a mais naquele período.

Na gravura as principais construções estão sinalizadas: G, Casa do Governo; A, Convento do Carmo; C, Colégio dos Jesuítas; K, Convento de São Bento; H, Porta de São Bento; F, Cárcere; E, Sé; […] Nessa época não possuíam as características arquitetônicas atuais, algumas das edificações citadas passaram por sucessivas obras e acréscimos nos séculos seguintes, especialmente no XVIII. Importante frisar que nem tudo na imagem condiz com a realidade da época, com uma série de equívocos, principalmente nas construções retratadas e suas características.

O registro é um das raridades que mostram a capital da América Portuguesa no século XVII. Naquele momento estima-se que viviam uma média de mais de 8.000 mil pessoas na cidade, lembrou Thales de Azevedo no livro Povoamento da Cidade do Salvador.


RAFAEL DANTAS é historiador, professor e artista plástico. Pesquisador na área da cultura material e iconografia. É um apaixonado pelos encantos de Salvador, do Egito e da Bahia. Também dedica seu tempo em registar e contar nossa história em desenhos.