Revista Sobrado
Arte: Yago Vieira / @yagoquefez

Voltaire Fraga e os horizontes de passados em Salvador

Salvador da Bahia na década 40 do século XX era uma cidade incrustada entre o velho com sopros de modernidade. No centro antigo, sempre pulsante, os velhos sobrados eram parte da paisagem, como um elemento da encosta, carregando em suas paredes anos de história.

Comércios, residências, pensões, casas de diversão, bares e quartos cheios de vivências em suas paredes, eram lugares que possibilitavam vistas para uma Baía de águas calmas. Além de Jorge Amado, que registrou em seus livros essa cidade de becos e vielas, outro artista, esse das imagens, capturou uma Bahia perdida no tempo, uma Salvador em preto e branco pintada de gente. Apresento a Bahia de Voltaire Fraga.

Na fotografia de Fraga, que ilustra esse texto, ainda temos o sobe e desce de ladeiras marcando o contexto entre as duas cidades, a Alta e a Baixa. Diversidade e desigualdades caminharam e caminham lado a lado por essas ruas. A predominância dos ternos em linho branco, alguns chapéus, vestidos com colorido em detalhes envoltos na suavidade baiana, pincelava as ruas descritas pelos artistas daquela época.

O Elevador Lacerda, construído na segunda metade do século XIX, reformado na década de 30 do XX, rompeu escandalosamente a vista de contornos coloniais e ecléticos. Trouxe ainda mais beleza se projetando para a Baía de Todos os Santos.

Foto: Voltaire Fraga

A perder de vista céu e mar se encontram separados pelo limite distante de um horizontes de passados. A Salvador dos anos de 1940, perdida no tempo, está cristalizada na fotografia do Fraga. Alguns dos sobrados retratados desapareceram, estão arruinados ou foram substituídos pela sanha de novidades. Outros sobrevivem, reformados ou reutilizados, entre as modernidades e velhices da Bahia.

O homem que desce a ladeira da montanha, marco da engenharia da segunda metade do século XIX, de roupas pretas, levemente contempla a vista, essa ainda hoje presente, de uma baía e suas Bahias. A fotografia de Voltaire Fraga é um registro que une tempos e que evidencia camadas de história da cidade.


RAFAEL DANTAS é historiador, professor e artista plástico. Pesquisador na área da cultura material e iconografia. É um apaixonado pelos encantos de Salvador, do Egito e da Bahia. Também dedica seu tempo em registar e contar nossa história em desenhos.