Revista Sobrado
Foto: Samuel Macedo / Divulgação

Betão Aguiar: “É muito difícil pra quem faz e vive de Carnaval todo ano”

Filmado durante o carnaval soteropolitano de 2020, o longa-metragem Samba de Santo – Resistência Afro-baiana, do músico e pesquisador Betão Aguiar, tem sua primeira exibição na 44ª Mostra de São Paulo, que já está no ar e dessa vez com exibição online para todo o Brasil.

O filme de 1h20min acompanha os bastidores de alguns dos tradicionais terreiros de candomblé de Salvador, que deram origem aos principais blocos afros da cidade: Bankoma, Cortejo Afro e Ilê Aiyê.

Betão, filho do cantor Paulinho Boca de Cantor, há 10 anos realiza um importante trabalho de pesquisa e registro da cultura popular brasileira pelo viés da música, o projeto Mestres Navegantes. Esse novo longa, o primeiro de Betão, é apenas mais um braço desse grande projeto que no total já lançou 29 discos.

Em entrevista para a Sobrado, Betão falou sobre a produção deste que é seu primeiro longa, sua relação com os blocos retratados, os 10 anos do projeto Mestres Navegantes, a mistura do tradicional com o novo e o que vem pela frente.

Sobrado: De onde surgiu a ideia de gravar o Samba de Santo – Resistência Afro-baiana? Foi um desdobramento das pesquisas do Mestres Navegantes?
Betão Aguiar: Nos últimos três anos eu estava fazendo uma pesquisa em Salvador, no Recôncavo. Minha família é toda daí. Meu pai [Paulinho Boca de Cantor] trabalhou com muita gente daí, de Brown a Caetano, Gil, Márcio Victor. Eu estava fazendo um mergulho nas raízes das músicas baianas, nos sambas de roda, nos sambas rurais. Os últimos três discos que a gente gravou para o projeto Mestres Navegantes foram discos de Candomblé. Vou chegar no filme já, já. E esses três discos me abriram um mundo muito grande na cabeça porque por mais que eu tivesse tido contato desde pequenininho com vários terreiros, em festas e tal, eu conhecia muito superficialmente as coisas do Candomblé, sabe? As nações, as diferentes línguas, os toques, são muitas entidades, enfim. No Jeje é uma coisa, no Ketu é outra, e isso abriu muito o meu mundo. E ao mesmo tempo que eu fiquei muito maravilhado, a gente fica um pouco frustrado assim de dizer como a gente não sabe essas coisas, como a gente não aprende dessa cultura na escola. Como essa cultura, principalmente de matriz negra, ela é meio apagada. As histórias não chegam para a gente. Eu fiquei com uma vontade de fazer mais um filme do Mestres sobre isso, das diferentes nações de Candomblé que existem porque acho que pouca gente sabe. Muita gente fala do Candomblé Ketu, iorubano, de Orixá, Oxalá, Oxum, Oxóssi, Iemanjá. Pouca gente conhece o Jeje, até porque é mais fechado; pouca gente conhece o Angola, é outro panteão de identidades. Achei que seria legal fazer um filme sobre isso.

S: E como se deram as pesquisas? Você já tinha todo um planejamento de quais terreiros iria visitar ou eles foram surgindo no caminho?
BA: Quando a gente veio fazer uma pesquisa em dezembro, chamei uma amiga querida que é diretora daí, a Gabriela Barreto, do Memórias Afro Atlânticas. Ela ia me ajudar na pesquisa, mas se enrolou toda, acabou me largando um pouco na mão, em cima da minha viagem de visita, e a gente tinha nada. Em janeiro desse ano eu embarquei pra Bahia, tipo dia dez. Assim, sem a minha pesquisa, sem nada, nada. Aí eu fui levantando do zero, procurando outros terreiros. Os terreiros que a gente tinha gravado não estavam muito abertos, a gente não conseguia encontrar, era começo de ano, tava todo mundo muito agitado. E aí, cara, caí nesses terreiros de Ilê, Cortejo e Bankoma. Eu já tive contato antes com o Ilê e com o Cortejo, trabalhando como músico, mas eu não sabia também tão de perto, e quando eu visitei foi muito surpreendente como essas histórias, esses personagens, foram aparecendo de um jeito muito aberto, muito carinho, muito receptivo. Então surgiu um filme. Coincidentemente, cada um é de uma nação. O Ilê é de Jeje, o Bankoma é de Angola, e o Cortejo é de Keto. Acabou que eu trouxe o filme pra essa coisa dos bastidores. Eu criei uma narrativa pensando em mostrar os bastidores, todo esse outro lado que está por trás da beleza, mostrando a dificuldade que eles têm pra botar tudo na rua. Eu também sou músico de carnaval há mais de 25 anos, já trabalhei muito no Carnaval, sei que é muito difícil pra quem faz e vive de Carnaval todo ano. É muita ralação, a gente nunca tem certeza de nada, e eu quis mostrar isso do viés do Candomblé também. Como os terreiros se organizam, como essas comunidades, que tem uma força super latente e muito calcada nos movimentos negros, se organizam pra conseguir botar tudo na rua.

S: Imagino que filmar no Carnaval, principalmente o de Salvador, deva ser muito difícil. Como foi o esquema? Tudo saiu como planejado?
BA: Abrimos a câmera e começou a surgir aquela mágica do cinema de coincidências e sincronicidades. Filmar no Carnaval foi muito difícil, não dá pra coreografia nada, você vira na esquina muda a locação, muda tudo. Quem tava aqui vai estar ali e achei que foi muito mágico mesmo. O diretor de fotografia, o Bruno Graziano, me contou também que pra ele foi uma experiência muito mágica de encontrar uns planos, porque tem oito, dez horas de desfile, e o que você vai filmar pra ser bonito? Como você vai filmar? De onde? Você passa por baixo de um poste e é uma luz, em outro poste é outra. E a gente acabou sendo surpreendido assim com a sincronicidade das coisas. Depois, na ilha de edição, foi a mesma coisa. O material meio que se mostrou pro montador. Ele também contou que foi muito fácil encontrar os melhores trechos, os melhores planos, e as sequencias foram surgindo muito facilmente. Acabou que deu todo um contexto, já que o filme fala na verdade dos três blocos, visita de perto o pré-Carnaval deles, os últimos dias de preparo. A gente cobriu dois desfiles de cada um. Pudemos ver melhor o preparo, o cuidado, as dificuldades. Foi uma coisa muito natural.

S: Existe um discurso político muito forte no filme desde a ideia, já que você aborda uma religião ainda hoje muito perseguida e de origem negra. Como você, sendo um homem branco, se sentiu no processo de contar essa história?
BA: Acredito que por conta desse momento político muito difícil que estamos passando, de muita violência, naturalmente esse assunto surgiu deles. Fico muito feliz que tenha sido assim, porque sou branco e é muito delicado você querer falar de um lugar que não é o seu lugar de fala. E eles me receberam muito bem, se abriram a isso e falaram de muitas coisas que são muito importantes de a gente abordar. O filme traz um pouco desse sabor político também, além de toda a beleza, toda a plasticidade, toda coisa estética, musical, a riqueza, religiosidade, o legado das Mães de Santo, desse sistema matriarcal foda que tem nos terreiros daí, que as mães é que mandam. Tem um pouquinho de tudo, mas esse cunho político veio muito deles e a gente só fez não atrapalhar. Deixamos a coisa rolar e em todas as etapas só estamos de coadjuvantes mesmo, tentando não interferir na fala deles.

S: Esse é seu primeiro trabalho de direção num longa-metragem. Como você difere esse trabalho de um longa para seus curtas e como ele se encaixa no projeto Mestres Navegantes?
BA: Ótima pergunta. Assim, eu tô há mais 10 anos fazendo curta. Na verdade, eu sou músico desde criança e minha liga com a arte sempre foi música. Embora eu tenha trabalhado em várias produções audiovisuais – fiz a trilha de O Paí, Ó, fiz muita coisa de campanha publicitária. Acompanhei muito de perto o audiovisual, mas nos curtas que eu fazia do Mestres, primeiro que era por uma demanda específica do projeto, eles tinham que ser meio curtinhos, cinco, sete minutos porque tinha um perfil de público que consumia mais desse jeito. Depois eu fui chamado pra fazer uma série de TV chamada Brasil Folclore, o Povo Brasileiro em Festa. São treze festas de diferentes estados do Brasil e foi onde a gente teve uma experiência um pouco mais ampla de entender a coisa de narrativa, de montagem, de saber quando a entrevista deu, saber o que querer mostrar, qual caminho visual, e fui afinando um pouco meus conceitos, minha base audiovisual. Recentemente eu fiz o curta Chegança No Jardim das Belas Flores, que é sobre as Cheganças femininas, dirigi com o Bruno Graziano, e acompanhamos as Cheganças no ano que foram tombados, ali em 2018 para 2019. A gente pegou a festa do encontro de Saubara e mostramos o de Arembepe também, das duas únicas mulheres que resolveram fazer um grupo de Cheganças porque os homens não as deixavam participar. E ali eu fui afinando também com o Bruno, que também foi diretor de fotografia, e aí rolou essa ideia do Samba de Santo, que foi bem orgânica e fluida. A gente nem esperava fazer um longa e acabou virando, e eu sinto que tem uma diferença muito grande porque normalmente você filma pensado para longa, né?! Então quando a gente tava filmando, o pessoal da equipe até brincava falando “Pô, cê tá filmando seu longa”, “Tô ligado que cê vai fazer um longa”. E eu só deixei fluir. Ao mesmo tempo que eu preenchi bem, enchi de material, a gente tem quase 30, 40 horas de material. Eu sabia que tinha como achar um longa ali dentro, mas eu não tinha ainda essa pretensão.

E como isso se encaixa no Mestres, pra mim eu vejo que tem um diálogo forte com um projeto recente que a gente lançou, um disco chamado MESCLA BR, que é um disco de reinterpretações de produtores da nova geração, como o Mahal Pita, Curumin, Felipe Cordeiro. Eles visitam a obra ancestral desses mestres e eu acho que o Samba de Santo tem um pouco a ver com isso. Uma coisa que eu faço há algum tempo é não falar desses mestres num lugar de folclore, de identificar que eles são contemporâneos também. As pessoas geralmente falam de mestre como uma coisa que tá lá no passado, esquecido, que já passou, do tradicional. E tradição vem da contradição, principalmente no Brasil, uma coisa muito contraditória. Então eu acho que o Samba de Santo, pra mim, fecha um pouco esse ciclo. A gente está comemorando 10 anos do projeto e eu queria chegar nesse lugar mesmo, de mostrar que essas pessoas que são do Carnaval de Salvador, como o Ilê Aiyê, por exemplo, que é um bloco conhecido mundialmente; o Cortejo Afro, com o [Alberto] Pitta, que assinou a coleção da Farm e foi a primeira vez que a Farm esgotou uma coleção; mostrar o que eles têm de estética e o que eles têm de música é algo super moderno, super atual, consumido no mercado, e que ao mesmo tempo eles são todos de fundamentos, eles são de terreiro. Eles carregam todos esses saberes, toda a estética, e tudo que eles desenvolvem vem de uma sabedoria ancestral oral, que está onde eles aprenderam. Pra mim fecha muito esse ciclo de mostrar que o projeto do Mestres registra a arte que vem desse lugar oral do Brasil, das tradições, mas não necessariamente folclóricas. Eu nem gosto desse termo. Acho que a gente associa isso a uma coisa que já foi, já passou. E nem resgate, acho que nenhum deles precisa ser resgatados. Eles estão aí! Mestre Curió, por exemplo, a gente teve uma baita matéria legal recentemente no A Tarde, que foi capa do Caderno 2+, que tem uma foto enorme de Curió e tem lá Gilberto Gil pequenininho. Para eles, isso é uma coisa muito valiosa. Eles se sentirem de igual para igual, ou até com maior destaque porque é um grande artista. Todos eles são grandes artistas. Eles são grandes compositores, são grandes mestres mesmo.

S: Vocês estão fazendo 10 anos com essa pesquisa, esse projeto, e lançaram 29 discos até agora. Nesse tempo, muita coisa mudou. Desde o consumo da música até novos tipos de produção musical. O que vem pela frente?
BA: Eu pretendo seguir nesse caminho. A gente entregou disco para as pessoas, todos os grupos receberam 400 discos, em formato de CD, pra cada um. Isso fazia muito sentido há 10 anos e foi enfraquecendo nos últimos anos. Mesmo no sentido conceitual do projeto, na linguagem, eu acredito que o audiovisual está sendo muito mais efetivo pra eles, pra divulgar o trabalho. Eles mesmos estão procurando por isso, mais do que só entregar um CD. Esse ano eu fui pra Bahia levar os CDs e levei também pen-drive com todo o material que a gente gravou, filmado em câmera A e câmera B. O material bruto mesmo, além de 150, 200 fotos de cada um. Eles gostaram mais do pen-drive do que da caixa de 400 discos. Eu achei massa, então eu tenho que identificar onde que o projeto pode continuar sendo efetivo pra eles. E, por exemplo, o maior retorno pra mim é ver Alberto Pitta, que me mandou um vídeo de depoimento foda sobre o filme, e o pessoa do Bankoma que estão muito felizes. Val [Benvindo], do Ilê Aiyê, que é neta de Mãe Hilda, tem a produtora dela, uma mulher super forte do movimento negro atual e disse que foi uma das entrevistas que ela fez e se sentiu mais a vontade. Isso pra mim já vale tudo. O projeto sempre atuou nesse lugar. A gente não faz preservação, quem faz isso são eles. É muito mais importante eles acharem que o que eles fazem é de foder. Isso pra mim que é salvaguarda, não sou eu, o ator de fora, externo, um intermediário que vai se taxar como salvaguardista de uma coisa. Eles estarem achando legal, estarem felizes, Pitta [Cortejo Afro], Vovô e Val [Ilê Aiyê], Géssica Neves [Bankoma], eles estarem felizes não tem preço.

S: O filme estreia na Mostra de São Paulo, imagino que depois vocês devem realizar exibições em outros lugares. Mas a ideia sempre foi estrear primeiro no Brasil?
BA: Eu quis fazer um caminho inverso porque a maioria dos filmes nacionais pensam primeiro em estrear em festivais internacionais pra depois estrear no Brasil. Até porque os festivais do Brasil nem sempre dão olhos ao que é produzido antes de chegar lá de fora. Pode ver que na Mostra a maioria dos filmes já passaram por algum grande festival, foram selecionados. Eu quis fazer um caminho inverso porque no projeto a primeira galera que eu mostro o filme é o pessoal que eu gravei. Pra mim, isso é um ponto pacífico. Termina um produto do projeto, com quem eu fiz, o objeto da coisa, tem que ser privilegiado. E esse ano, por causa da pandemia, a gente não pôde fazer uma sessão. Já era pra eu ter ido aí levar o filme, assistir em cada terreiro. Tem uma história com Arani Santana, da secretaria de cultura, que é de tentarmos fazer alguma coisa assim que melhorar a pandemia, fazer uma sessão grande. A gente tem muita vontade de fazer isso, mas vamos passar mais um bom tempo tentando festivais de fora com o projeto Samba de Santo em si, depois disso, quando vier lá na frente, a gente vai ver distribuição. Não temos nenhum contrato ainda, tem uma convenção e outra ali, mas acho que é muito cedo pra pensar nisso. Ainda tem um ano, um ano e pouco até poder exibir publicamente.

S: Pensa em fazer um desdobramento desse filme em outros lugares ou talvez aqui na Bahia mesmo?
BA: Cara, tem uma história que eu estou bem a fim de fazer, porque eu tô morando no interior de São Paulo há algum tempo, em São Luiz do Paraitinga, e aqui tem uma coisa muito curiosa… A negritude daqui foi meio apagada e eu tenho muita curiosidade de ir atrás, porque tem um bairro aqui chamado Raizeiro, mas é uma coisa incipiente ainda. Na Bahia, cara, eu tenho muita vontade de continuar mesmo. Eu acho que cada um desses blocos mereciam um documentário só deles. Tem muita coisa que me atrai, mas não tem nada engatilhado que eu posso te falar “vai rolar!”, até porque com documentário é muito de você ir encontrando o filme mesmo, e tá tudo muito difícil. A gente tem patrocínio, a Natura Musical tá junto, o Governo do Estado ajuda com o Fazcultura, mas o maior recurso que a gente tem é o humano mesmo, a equipe, a galera querendo. E eu tenho muita vontade de fazer mais alguma coisa sobre os Candomblés mesmo.

S: E para o Mestres Navegantes? Pensa em fazer algum longa específico para ele?
BA: O projeto do Mestres tem alguns caminhos traçados, eu tenho muita vontade de seguir fazendo outros longas, de outros lugares também que eu já passei, inclusive pelo Brasil Folclore, que a gente visitou o Maranhão, o Pará, que são lugares que eu tenho muita vontade de voltar pra fazer longas e outros filmes com outros mestres. E a Bahia eu sinto que ainda devo a essa cultura daí, não só pela minha formação musical de ter vindo da família Novos Baianos, de ter tocado com Moraes e tudo, mas porque eu identifico muitos traços de musicalidade que eu já visitei tocando com Moraes Moreira, com Carlinhos Brown. Eu sinto muito forte as coisas dos terreiros, dos toques, as claves rítmicas. Ainda tenho muito a pesquisar, aprender, a conhecer e registrar. Se Deus quiser e me der saúde a gente ainda vai fazer muito filme por aí também.

S: Vocês também levaram todos os discos para as plataformas de streaming, como Spotify. Isso também vem da vontade deles de não ficar apenas nos CDs físicos?
BA: O CD não é mais uma mídia útil. Pouca gente ouve, pouca gente tem aparelho. Os próprios mestres não têm. Muitos me cobravam querer postar alguma coisa e não ter no Spotify, não ter no YouTube. Sempre tive essa demanda. Tinha dificuldade em fazer isso porque não temos um projeto específico, verba, grana pra fazer só isso. E isso dá muito trabalho! A gente gosta de fazer tudo certinho, organizar todos os ISRC, que tem que ser registrado em nome dos mestres. Se for buscar outros grandes projetos que tiveram antes, é difícil de achar o ISRC. O ISRC é tipo o RG daquela gravação. Ali é onde tem quem tocou o quê e isso é o que vai para o ECAD, que é o órgão que arrecada, que pode repassar a grana para as pessoas. Eu demorei muitos anos para poder fazer isso, e só agora, por conta da pandemia, eu pude sentar com a Marília, que trabalha comigo, e fazer disco por disco. Fechei parceria com a Altafonte para distribuir tudo isso nos streamings, porque incomodava não estar com essa documentação toda resolvida e lançar. Arrecada muito pouco dos streamings, mas mesmo o pouco é justo. Eu não gosto de fazer as coisas injustamente. Então eu mostrava para eles, dizia “esse é seu ISRC, vá atrás do ECAD, se associe a uma arrecadadora”. O projeto sempre teve um lado meio educacional para esses mestres. A gente sempre educou, explicamos que o que eles recebiam era um cachê pela gravação, a outra grana era de direito autoral da imagem dele. Eles nunca tiveram esse background pra saber sobre direitos autorais, arrecadação… Entregamos também os masters para eles. Gravamos uma hora e meia, duas horas de cada grupo, e a gente usa na coletânea 20, 25 minutos, mas eu vou lá e entrego as duas horas mixadas, masterizadas, com todas as fotos que ele quiser. Bons grupos fizeram os discos deles sozinhos. A Marujada de Paratinga fez um CD inteiro com esse material que a gente entregou. A gente tem essa coisa de dar a vara, de estimular, para que eles possam ir direto no edital da Secult, da Natura Musical e fazer o projeto deles. E o streaming também tem essa importância pra chegar em mais gente, por números mesmo. Isso mostra que aquele grupo tá em constante transformação. Tem a mesma tradição oral, adaptada pra linguagem de hoje. Estar nas plataformas tem muita sintonia com isso. É um jeito desses mestres estarem atuais numa linguagem de hoje, mas preservando totalmente a originalidade, a fonte de sabedoria deles.