Revista Sobrado
Foto: Ethos Comunicação e Arte / Divulgação

Franthiesco Ballerini: “Acredito que o jornalismo passa por uma crise de mediação”

Jornalista, ex-repórter e crítico do Grupo Estado, do qual fez parte por sete anos e produziu reportagens especiais e entrevistas em diversos países, Franthiesco Ballerini é atualmente professor, doutorando em Comunicação Midiática, Processos e Práticas Culturais. Tem especialização em audiovisual e jornalismo cultural, foi colaborador de revistas como Cult, Bravo!, Contigo e Quem, além de ter atuado como colunista cultural da Rádio Eldorado, TV Gazeta, e no Observatório da Imprensa.

É autor de Diário de Bollywood, primeiro livro em língua portuguesa sobre o cinema indiano, Cinema Brasileiro no Século 21, considerado referência de consulta para quem estuda e trabalha com audiovisual no Brasil, Jornalismo Cultural no Século 21, fruto de três anos de pesquisa e Poder Suave – Soft Power, com prefácio do ex-ministro da Cultura Juca Ferreira, que aborda o poder de persuasão da arte e entretenimento. História do Cinema Mundial traz um panorama do cinema de diferentes lugares do mundo, com prefácio de Walter Carvalho, de Central do Brasil (indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro), todos publicados pela Summus Editorial.

Na área acadêmica, trabalhou como coordenador geral da Academia Internacional de Cinema, professor de Comunicação e Audiovisual, ministrou palestras, workshops e masterclasses em instituições de ensino no Brasil e no mundo, além de prestar consultoria em cultura e cinema a grandes empresas como Google Brasil e Walt Disney. Sua mais recente empreitada foi através da Ethos Comunicação e Arte, um núcleo multiplataforma especializado em Comunicação segmentada em Cultura e Artes em geral. São suas três frentes a Comunicação Estratégica, a Produção de Conteúdo e a Formação Profissional.

Em entrevista à Sobrado, o professor Ballerini relata as suas perspectivas em relação ao exercício e ensino do jornalismo cultural em meio a dinâmicas efêmeras de produção e consumo de conteúdos, além dos desafios regulares da profissão.

Sobrado: A migração para o digital implicou em mudanças na produção e distribuição de produtos culturais. Por um lado, facilitou a ampliação e alcance de público, por outro, precarizou o trabalho de muitos artistas. Qual a sua perspectiva em relação a isso?
Franthiesco Ballerini: Não acho que o acesso foi facilitado, isso tudo depende muito. Temos que pensar que existe uma parcela enorme da população sem acesso à internet e cujos produtos físicos são mais fáceis via bibliotecas, prefeituras, centros educacionais etc. Acho que está ocorrendo uma alta concentração em poucos grupos com muito poder econômico e isso rende em uma baixa empregabilidade para os demais, sou bastante crítico quanto a esse ponto.

S: Diante de um cenário de Infodemia, como o Jornalismo Cultural pode continuar exercendo o seu papel de mediador entre arte e consumo?
FB: Neste momento é algo exato, acho que o jornalismo está passando por uma crise de mediação e de filtros, ou seja, ele sempre foi um bom mediador entre público, artistas e a produção cultural como um todo. Agora, com a inserção de novos mediadores como, por exemplo, os influenciadores, youtubers, isso tende a se agravar um pouco mais pela quantidade de informações que o leitor tende a receber destas outras fontes, talvez seja algo que não permaneça durante muito tempo, não dá para dizer. O diferencial a meu ver é justamente a formação acadêmica do jornalista cujas especificidades nenhum outro campo oferece. Acho isso algo preocupante porque o jornalismo sempre exerceu um bom filtro, não é?

S: Tendo como exemplo as últimas edições do Big Brother Brasil e a comoção gerada pelo programa nas redes sociais, é possível que a Indústria do Entretenimento e o Jornalismo Cultural cooperem para o fomento de discussões e debates acerca de questões políticas e sociais de modo a elevar as reflexões críticas à respeito?
FB: Então, sempre houve uma colaboração, especialmente no esporte e no jornalismo, aliás, dá uma olhada como agora o esporte na Globo é entretenimento e não mais jornalismo com o Galvão Bueno fazendo propaganda das Havaianas. Eu acho isso gravíssimo, porém, o entretenimento sempre ajudou a fomentar discussões e essa aliança com o jornalismo cultural é frutífera, vai continuar acontecendo. Eu aplaudo, mas também é necessário ter cuidado porque não é algo possível de ser feito com todo e qualquer tipo de entretenimento. Sou um pouco arredio com relação ao excesso de atenção e fama que esses brothers e sisters ganham, relevância essa inclusive que muitas pessoas que desenvolvem um trabalho sério não ganham durante toda uma vida, realmente me preocupa muito.

S: Como o jornalista cultural deve proceder diante de dinâmicas como a Cultura do Cancelamento e a Polarização nos ambientes digitais de maneira geral?
FB: O jornalista cultural precisa evitar o cancelamento promovendo uma discussão mais ampla, menos superficial e mais embasada. Esse pode ser o grande diferencial do Jornalismo Cultural em relação ao que vemos nas redes sociais, no YouTube, onde muita gente dá opinião e acha que é crítico. Tenho a impressão que muitos profissionais estão acuados, vejo grandes jornalistas culturais, ex-alunos, que trabalham em grandes revistas e jornais e não tem coragem de falar bem de um trabalho do Woody Allen, por exemplo, por que ele foi cancelado. Isso eu acho o fim da picada, é preciso ter coragem de ir contra a correnteza.

S: Quais as suas percepções acerca da busca por instrução e conhecimento especializado na Ethos Comunicação e Arte?
FB: Estou muito feliz com o modelo da Ethos, apesar de não ser um formato muito popular justamente pelo caráter desafiador onde o aluno tem acesso a um belíssimo material escrito, em vídeo e o processo é acompanhado simultaneamente pelo professor. Não é todo mundo que aproveita 100% e isso é uma pena, alguns adquirem os cursos e não fazem os exercícios, mas os que se propõe a isso alcançam o conhecimento e daí vem a transformação da educação. A ideia da Ethos é que o aluno entre num curso e comece a fazer vários outros para consolidar uma formação integral e holística, esse é o nosso grande desafio.

S: Como o leitor pode contribuir na elaboração e fomento de um Jornalismo Cultural de qualidade?
FB: O leitor já contribui para um jornalismo cultural de qualidade porque quando existe o hábito de leitura isso já vai fomentando um apuramento do olhar. Eu odiava ler mas ainda adolescente comecei a minha vida de leitor através da Superinteressante, isso me fez passar para os livros do Amyr Klink, do Jô Soares e a partir daí comecei a me desafiar a ler os clássicos, Dostoiévski, Tolstói e isso foi ajudando a melhorar o meu olhar. Considero a leitura naturalmente um propulsor potente para um bom jornalismo.