Revista Sobrado
Foto: Jonas Santos / Divulgação

Major Denice: “Nosso modelo de carnaval deve incluir os blocos afros em toda a sua estratégia de revisão”

Entre os destaques do plano de governo da candidata a prefeitura de Salvador pelo PT, Major Denice, ela ressalta que “é necessário romper com a lógica de subordinação da cultura ao turismo e impulsionar uma política cultural que tenha compromisso com o modelo de desenvolvimento de valorização do potencial cultural de Salvador”.

Para por esse desejo em prática, estão entre as propostas da candidata a criação de um Atlas Cultural e a criação de uma empresa que possa dar agilidade aos projetos para consolidar o desenvolvimento da cultura audiovisual local.

Em entrevista para a Sobrado, ela explica um pouco mais sobre esses projetos e debate sobre o desafio da pandemia com a cultura, o desejo de tornar Salvador em um polo da cultura negra mundial e a perspectiva dela para os blocos afros da capital.

Sobrado: Devido a pandemia, o setor cultural está parado e ainda não sabemos quando e como será este retorno. O que a próxima gestora ou gestor de Salvador deve encarar para reativar os teatros, casas de shows e outros espaços culturais da cidade? Se eleita, qual será o papel do governo da senhora para com o setor cultural?
Major Denice: A pandemia é um desafio em comum para todas as cidades que têm essa mesma dinâmica. A retomada dependerá essencialmente da descoberta de uma vacina que permita dinâmicas de aglomeração. Enquanto isso não acontece, o poder público pode ser um agente importante no desenvolvimento de novos modelos de oferta de conteúdo enquanto indutor de políticas públicas de cultura e turismo.

Acreditamos que os protocolos de retomada devem ser realizados em processo de escuta com os agentes dos setores, de forma a conjugar cuidados gerais de saúde pública com especificidades setoriais

S: A senhora já pensa num nome para estar à frente da Secretaria de Cultura? E qual perfil deve ter essa pessoa?
MD: O principal perfil para a escolha da nossa equipe de Governo é ter compromisso com a vida das pessoas. Ao tomarmos posse iremos apresentar uma equipe comprometida e com a cara da nossa cidade.

S: No programa de governo da senhora, é citado um projeto chamado “Atlas Cultural”. O que seria este programa? Pode nos dar mais detalhes?
MD: Queremos “apresentar” Salvador implantando um programa amplo de atividades e oficinas artístico-culturais, desenvolvidos durante todo o ano nos territórios culturais da cidade, a partir da vocação e história de cada lugar, ocupando e valorizando os espaços e abrindo novos em praças e pontos de convívio, além de implantar a versão municipal dos Pontos de Cultura e Jovens Multiplicadores de Cultura, com mapeamento dos espaços considerados culturais nos bairros.

S: A senhora também cita a criação de uma empresa voltada aos projetos audiovisuais. Este setor há muito tempo vem enfrentando problemas com o governo estadual, principalmente em se tratando de uma falta de editais calendarizados. Essa empresa proposta pela senhora pode ser um novo caminho para os trabalhadores do audiovisual? Se sim, como e por quê?
MD: Queremos transformar Salvador no Polo da cultura audiovisual e de eventos. Para isso consideramos fundamental a criação de uma empresa que possa também atuar como uma escola e que priorize a agilidade dos projetos, oferecendo capacitação e apoio tecnológico nos 13 centros de Economia Criativa espalhados pela cidade e produzindo conteúdos contemporâneos e com a cara da nossa cidade.

S: Lendo o plano de governo da senhora, percebesse que não há propostas que deem continuidade a projetos já estabelecidos na cidade, desde o Boca de Brasa, Pelourinho Dia e Noite e outros. A senhora pensa em dar continuidade a eles? Qual o motivo desta ausência?
MD: Todas as políticas públicas implantadas na cidade em qualquer mandato serão analisadas e discutidas amplamente com os setores e categorias interessadas. Assim também será com os projetos atualmente desenvolvidos na cultura.

S: Salvador é uma cidade que ainda precisa lidar com uma grande desigualdade social e sabemos que a cultura muitas vezes é elitista. Qual a opinião da senhora sobre este fato? O que pode ser feito para que a cultura e as artes sejam mais acessíveis?
MD: A cidade possui cultura e arte em todos os bairros e das mais diversificadas linguagens. A acessibilidade, como descrita na pergunta, tem a ver com um perfil de arte consumida na cidade. Ao implantar o nosso programa Atlas da Cultura e apresentar a diversidade cultural que possuímos, iremos incluir e diversificar o público desta cidade.

S: A senhora diz em um trecho do plano de governo que “[Salvador] pode se tornar um polo mundial da cultura, especialmente da cultura negra”. Como isso seria implementado?
MD: A nossa proposta de transformar Salvador na Capital Cultural e Histórica do Brasil, e na Capital da cultura Negra do mundo, pretende estimular os novos produtos culturais baseados na nossa história e na nossa cultura raiz, formando gente e profissionalizando este setor, atraindo investimentos para gerar emprego e renda a partir do nosso potencial e dos nossos talentos.

Iremos inserir a história e a cultura da nossa cidade e do nosso povo no currículo das escolas e na formação de todos os profissionais que trabalham diretamente na cadeia produtiva e da hospitalidade: bares, restaurantes, hotéis, pousadas, guias e transportes.

Consideramos que esse programa apresenta um forte caráter de resgate da nossa origem e da nossa história.

Acreditamos que os moradores e, também, os visitantes querem vivenciar um lugar vibrante, acolhedor, reconhecido pelo mundo pela sua singularidade que é a história da nossa cidade. Isso passa pela conjunção de uma cidade que acolha bem os que nela moram e os que a visitam. Importante que as políticas públicas tenham essas marcas em suas estratégias de planejamento.

S: Nossos blocos afros lutam todos os anos para sair no Carnaval, contando com pouco apoio dos governos estaduais e municipais. Considerando que é durante o Carnaval que eles conseguem a principal fonte de renda anual, seria possível pensar na maior festa de rua do planeta dando destaque para esses projetos que há muito tempo perdem espaço na nossa cultura? Se sim, como?
MD: Nos últimos anos temos visto outras cidades investirem no carnaval de rua. Além dos tradicionais polos Salvador-Recife-Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte tem emergido como alternativas que vem ganhando espaço e se consolidando como concorrentes. Salvador deve saber aproveitar a singularidade da história de sua festa e a expertise empresarial desenvolvida. Isso passa por um debate que identifique os principais problemas e potenciais para que sejam priorizados no avanço do nosso modelo de festa incluindo a revisão do modelo de patrocínio, para melhorar as atrações e os empreendimentos de maneira mais democrática.

O nosso modelo de carnaval deve incluir os blocos afros em toda a sua estratégia de revisão. Consideramos que a história de cada bloco e seu funcionamento são singularidades da nossa cidade, marca da nossa cultura.