Revista Sobrado
Foto: Voltaire Fraga, c. 1960

MAM-BA: 60 anos de Arte Moderna à beira-mar

“Que igreja é essa daí?”, pergunta Rufino para Ana Paula. “É a igreja de Santa Luzia”, ela responde. “Por que está assim abandonada, sem ninguém?”, devolve o rapaz. A resposta final é a de que um crime aconteceu e a igreja ficará fechada por 100 anos. O diálogo é fictício e aconteceu em 1962, no longa-metragem “Tocaia no Asfalto”, de Roberto Pires. A igreja exibida em cena é a Capela do Solar do Unhão. Na época, ainda abandonado, o sítio arquitetônico do século XVII, que já tinha sido sede de uma fazenda açucareira e até mesmo uma fábrica de rapé, se preparava para uma grande reforma encabeçada por Lina Bo Bardi.

Alguns anos antes da estreia do trabalho de Pires, em 1958, o professor e arquiteto Diógenes Rebouças convida a arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi para lecionar um curso na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia. O convite resultou num dos movimentos de maior fruição cultural do final da década de 1950 e começo da década de 1960. Isso porque Bardi sempre foi muito bem relacionada e isso a ajudou bastante nas ações que ela queria empreender. O ano de 1958 foi, sem dúvidas, essencial para esses empreendimentos.

No mesmo ano de 1958, onde Lina começa a lecionar na Faculdade de Arquitetura, ela também faz a Casa do Chame-Chame, comissionada pelo advogado baiano Rubem Nogueira, além de fazer um breve retorno a São Paulo para realizar a exposição Bahia no Ibirapuera, na 5ª Bienal de São Paulo, a convite do fundador e diretor da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, Martim Gonçalves. Era o começo da forte ligação de Lina com a Bahia.

“A 5ª Bienal de São Paulo foi uma bienal extremamente importante”, conta Weslley Pontes, pesquisador de Lina Bo Bardi. “Lá existia um pavilhão chamado Bahia. Martim Gonçalves e Lina fizeram a curadoria e a expografia dessa grande exposição que teve repercussão inclusive internacional, com destaque na revista Time”, complementa. Weslley publica suas pesquisas sobre o período em que Lina viveu na Bahia em um perfil no Instagram, chamado Lina na Bahia.

Pontes ainda destaca que a vinda de Lina para a Bahia em 1958 é devido ao fato de a arquiteta ter encontrado um campo prolífico para poder atuar. “Ela rapidamente é abraçada pela classe artística local”, acrescenta o pesquisador. Foi ao lado de Martim Gonçalves, um dos que abraçaram as ideias da italiana, que Lina conheceu o Solar do Unhão.

Ela [Lina] rapidamente é abraçada pela classe artística local

Weslley Pontes, pesquisador de Lina Bo Bardi

Entretanto, o intuito de Gonçalves em mostrar o Unhão para a arquiteta era para que juntos transformassem aquele espaço numa escola de teatro experimental à beira-mar. Infelizmente, o projeto não deu certo. Mas isso não significou uma desistência de Lina em transformar aquele sítio histórico em algo para as artes.

Ao mesmo tempo, Juracy Magalhães, então governador do estado da Bahia, cria uma comissão de intelectuais e artistas, presidido por Lavínia Magalhães, esposa do governador, para discutir a criação de um Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA). Dentre as pessoas da comissão, estavam o artista Mário Cravo Jr., descrito por Pontes como “o braço direito de Lina em muitas ações”, e o jornalista e colecionador de arte Odorico Tavares, diretor da rede dos Diários Associados da Bahia. Lina, inclusive, escrevia uma coluna publicada no Diário de Notícias, na época um jornal que fazia parte do conglomerado.

Acredita-se que a ótima relação do jornalista com Assis Chateaubriand, proprietário dos Diários Associados e fundador do Museu de Arte de São Paulo (MASP), tenha sido importantíssimo para que o nome de Lina surgisse na mesa. Naquele mesmo ano, ela havia projetado a nova sede do MASP, na Avenida Paulista. Foi daí, então, que Lavínia Magalhães fez o convite para a arquiteta projetar e dirigir o MAM-BA.

O nascimento
Fatidicamente, em 1959, o Teatro Castro Alves pega fogo apenas cinco dias antes da sua inauguração oficial. Do incêndio, apenas o foyer e a rampa de acesso ficam intactas. Em ruínas, o teatro fica inutilizado até que as reformas estejam completas. Lina, então, propõe uma ocupação, transformando o foyer do teatro em espaço expositivo, a rampa de acesso em auditório, e criando cursos de iniciação artística para crianças nas salas do subsolo do teatro. E é no dia 6 de janeiro de 1960 que nasce, então, o Museu de Arte Moderna da Bahia.

“Lina tem uma ideia fantástica que é cercar e segmentar o ambiente com grandes cortinas e cria um sistema expositivo que é executado pelo próprio Mário Cravo Jr.”, conta Pontes. “Como o MASP estava em construção, e o acervo do MASP estava disponível, ela traz para a inauguração do MAM algumas obras de lá”, complementa.

MAMB – EXPOSIÇÃO TRÊS PINTORES – OBRA DE RENOIR CHEGA A SALVADOR | Foto: DIÁRIO DE NOTICIAS (02.04.1960) – PH DESCONHECIDO – ACERVO MAM-BA

Lina acreditava na ideia de um museu dinâmico, onde aconteciam debates sobre as culturas modernas e populares, sempre pensando na existência de uma cultura popular viva. Dessa forma, Lina que ao mesmo tempo pensava na proposta do Museu de Arte Moderna, passou a pensar também numa proposta de Museu de Arte Popular. No meio deste processo, o Teatro Castro Alves, onde o MAM-BA habitava os escombros nos últimos anos, precisava ter sua reforma para a reabertura oficial concluída. Ali perto, com a construção da Avenida Contorno, o Solar do Unhão fica desabitado e Lina vê nisso uma oportunidade para voltar àquele lugar e levar o museu para lá.

“O traçado inicial da Avenida Contorno passava por cima do Unhão, era uma coisa horrorosa. Destruía o casario. Lina conversa com Diógenes Rebouças, ele altera o traçado, e a obra é feita em oito meses”, conta Pontes. O pesquisador destaca que a velocidade com que a obra é feita teve influência de Lavínia e Juracy Magalhães, grandes apoiadores de Lina. “Eles eram grandes patronos da cultura e da arte nessa época, e a obra tinha que ser inaugurada ainda no mandato dele. A Odebrecht, que realiza a obra da Contorno, realiza também a obra do Solar do Unhão, que é feita às pressas para poder receber ambos museus”, completa Pontes.

Em 1963, o Solar do Unhão é inaugurado abrigando o Museu de Arte Popular da Bahia (MAP) e o Museu de Arte Moderna da Bahia. Além dos museus, o Unhão ainda abrigava o Centro de Documentação da Arte Popular, o Centro de Estudos Técnicos do Nordeste e as Oficinas do Unhão. Na inauguração do novo espaço, Lina realiza a grande exposição Nordeste. Pontes destaca que, para posteriormente à exposição Nordeste, Lina teve a ideia de um programa bastante ambicioso, que contemplava exposições com eixos Brasil-África e matéria indígena.

No entanto, ela não consegue levar adiante esse projeto. Em 1964, em decorrência do Golpe Militar, o braço do MAM-BA, que ainda funcionava no foyer do TCA, foi ocupado no dia 30 de julho pelos militares, que organizaram a Exposição de Material Subversivo, composto por material apreendido e considerado subversivo pelos militares, além de uma exposição de canhões postas na frente do teatro, substituindo a obra Antônio Conselheiro, de Mário Cravo Jr. Por conta disso, Lina pede demissão e se muda da cidade de Salvador.

Um pedido de retorno foi feito, mas Lina prontamente recusou. “Afirmo absoluta impossibilidade [na] reconsideração dada [a] impossibilidade [de] restabelecer condições necessárias [aos] objetivos culturais et museológicos”, escreveu Bardi em telegrama ao governador Lomanto Júnior.

Telegrama enviado por Lina Bo Bardi para o então governador do estado da Bahia, Lomanto Júnior

Com a saída de Lina, os dois museus são unificados no Solar do Unhão, adotando oficialmente o nome de Museu de Arte Moderna da Bahia e tendo Mário Cravo Jr., grande parceiro artístico de Lina, como novo diretor. Mesmo em meio à ditadura militar, o artista consegue dar segmento aos trabalhos pensados por Lina. Entretanto, Cravo Jr. pede demissão em 1967 e seu secretário executivo, Renato Ferraz, passa a ocupar o cargo até 1975.

São escassos os documentos sobre esses períodos que sucedem a saída de Ferraz. Documentos e relatórios de gestão das épocas seguintes são praticamente inexistentes, seja por uma falta de cuidado com a preservação da cultura na nossa história ou principalmente pelo descarte destes documentos no período da Ditadura Militar. O que se sabe, entretanto, é que o MAM, assim como outros equipamentos culturais, passou por um longo período de abandono.

A grande fruição artística das décadas de 1950 e 1960, por diversos motivos já não conseguiram exercer tamanha influência nas décadas seguintes. “Quando eu começo a minha condição artística, no começo da década de 70, o MAM não tinha aquele período do agito”, recorda o artista Almandrade.

Arte-educação
Em 1980, com Francisco Liberato à frente da gestão do museu, as oficinas ganham nova vida. É nesse período, que dura até o final da década, que uma nova leva de criadores começam a fazer o nome do MAM a ter destaque novamente. A diversidade nas oficinas, com nomes como Juarez Paraíso, Ieda Oliveira, Caetano Dias, Almandrade, Suzane de Pinho e outros, faz com que a ideia de museu-escola pensado por Lina volte a ser popular. Entre os alunos desses artistas estão Eneida Sanches, Marepe, Eckenberger, Zivé Giudice, Bel Borba, Tuti Minervino e Gil Bastos.

É nesse momento que acontece pela primeira vez uma exposição individual sobre um artista de Arte Contemporânea no MAM. A exposição de Almandrade, Sacrifício dos Sentidos, marca também o momento de reabertura política do país e um novo momento de reflexão das artes na Bahia.

O início da década de 1990 é marcado por um momento de mudanças políticas, com Antônio Carlos Magalhães retornando ao governo do estado da Bahia, e a chegada do museólogo Heitor Reis na direção do museu garante uma grande reforma no espaço.

Na reabertura do museu, em 1992, Reis realizou uma série de exposições, entre elas uma da vasta coleção de Gilberto Chateaubriand; uma outra chamada A pintura no acervo do MAM, com obras de Tarsila do Amaral, Volpi, Rubem Valentim, entre outros; a exposição A montanha e o mar, de Adrianne Gallinari, José Bento e Otaviano Muniz Barreto; e a exposição Coletiva das Oficinas, com obras dos participantes da oficina de Expressão Plástica.

Reis deu continuidade às oficinas iniciadas na gestão de Liberato. Eram oferecidas aulas de desenho, escultura, gravura, pintura e processos contemporâneos. Cerca de 900 alunos ao ano passavam pelas oficinas. Foi também nesse período que surge o popular Jazz no MAM, que segue vivo até os dias atuais. O museu voltava a ser habitado por todo tipo de gente.

Nesse momento, surgia também a Secretaria de Cultura e Turismo e a Diretoria de Apoio às Atividade Museológicas (DIMUS), onde o MAM passa a ficar subordinado. Nesse período, o MAM ganha destaque, pois a cultura fazia parte de um projeto político de desenvolvimento do governo. A partir disso, o museu ganha o Parque das Esculturas e a Sala Rubem Valentim, além de entrar no circuito dos museus internacionais, recebendo exposições de Yoko Ono e Picasso, por exemplo.

Ainda na gestão de Heitor Reis, o projeto Salão da Bahia foi criado. Com o intuito de dar um espaço para a livre expressão do artista, o projeto foi abraçado rapidamente pela classe artística. “Os salões ajudaram a cumprir uma função de produzir e gerar reflexão”, conta o artista plástico Caetano Dias. “Nessa época, era o museu mais atuante do Brasil”, afirma Zivé Giudice, artista e ex-diretor do MAM.

O museólogo Heitor Reis se despede da direção do MAM em 2006. Com a vitória de Jaques Wagner ao cargo de governador do estado, um novo momento político e cultural surge na Bahia. O governador decide recriar, após mais de 10 anos de seu fim, uma nova Secretaria de Cultura comandada por Márcio Meirelles. É então que a jornalista Solange Farkas é convidada para dirigir o MAM.

Novo momento
Criadora da Associação Cultural Videobrasil, Farkas trouxe para o MAM um olhar fresco e conectado com a arte mundial. Recebida com olhos tortos a princípio, principalmente por estar longe da Bahia há mais de 20 anos, logo seus projetos fizeram com que todos mudassem de ideia. “As pessoas da mídia naquele momento ainda eram todas atreladas politicamente ao governo de Antônio Carlos Magalhães, então usavam aquilo com uma coisa política. Bater em Solange, bater no MAM, é a mesma coisa de bater no secretário de cultura”, lembra Farkas.

Ela conta que o desafio era gigantesco, porque encontrou o museu numa condição precária. “Num ponto de vista do acervo, da coleção, estava numa fragilidade muito grande”, conta. “Aquilo se colocou imediatamente como uma questão emergencial, eu tinha que olhar para aquilo, para o governo poder tomar algumas providências porque o acervo estava de fato numa condição física e estética muito delicada”, complementa.

Além de criar uma reestruturação do modelo de gestão do museu, Farkas também foi responsável por pensar numa nova grande reforma para o Solar do Unhão. Entretanto, durante a gestão de Farkas a reforma nunca aconteceu. “Deixei um projeto de reforma que foi executado depois, mais ou menos”, conta.

Num ponto de vista do acervo, da coleção, estava numa fragilidade muito grande

Solange Farkas, ex-diretora do MAM

Apesar de ter um livro sobre o museu, lançado em 2002 pelo antigo diretor Heitor Reis, o MAM ainda não tinha um livro sobre seu acervo. Percebendo essa falha, Farkas fez um levantamento das obras e dois livros foram publicados. “Depois de tantos anos ali, o museu funcionando com acervo, não tinha uma catalogação, não tinha um livro. Tinha uma folha de papel pautado escrito à mão de alguns trabalhos”, comenta Farkas.

Após a saída de Solange Farkas em 2010, ela foi substituída pela professora Stella Carrozzo que ficou brevemente no MAM (de 2011 a 2012) e pelo jornalista e curador Marcelo Rezende (2013 – 2015). Nesse período, o museu foi marcado por grande instabilidade nas suas reformas. Tanto a classe artística quanto o público geral mostrou um grande descontentamento com a forma como as atividades do museu eram delegadas.

No final de 2015, o artista Zivé Giudice é convidado para se tornar o novo diretor do MAM. Essa primeira passagem do artista à frente do museu durou até o meio de 2016, quando o mesmo pediu demissão após alguns desentendimentos. “O museu entrou num declínio, a gente estava num processo de recuperação do museu do ponto de vista de uma programação, atividades paralelas do museu como oficinas e etc. Restabelecendo intercâmbio com outros espaços, não só outros museus do Brasil, mas espaços internacionais, com um protocolo de intenções de fazer intercâmbio. Quando eu saí, isso tudo paralisou, o museu ficou num declínio terrível”, lembra o artista.

Não demorou muito para que Zivé voltasse, em julho de 2017. Segundo ele, o retorno foi atendido por uma pressão dos colegas da classe artística. “Disse que voltava, mas dizendo que não ia abdicar da autonomia do museu. Disse que quem vai decidir sobre o MAM é o MAM. As pessoas podem fazer sugestões, mas o museu decide pelo seu calendário, sua pauta, seu conceito”, pontua. Nesse primeiro momento de retorno, o museu finalmente retoma as reformas iniciadas anos atrás.

Zivé, no entanto, lembra não ter se familiarizado com as reformas e por diversas vezes chegou a intervir no processo. Para ele, era primordial que se repensasse a estrutura do acervo, além de impedir que transformassem a sala de oficinas criada por Lina em um auditório. “Iam descaracterizar o espaço que é elogiado pelo mundo inteiro, o espaço reservado por Lina para o que seria a função de ser um museu-escola. Ali foi o lugar que ela destinou para isso, um lugar belíssimo e que não ficou obsoleto. Eles queriam o auditório e eu disse que não ia fazer, e não fizeram. Tive que brigar, lutar”, afirma.

Iam descaracterizar o espaço que é elogiado pelo mundo inteiro, o espaço reservado por Lina para o que seria a função de ser um museu-escola

Zive Giudicce, ex-diretor do MAM

O artista enquanto esteve à frente do museu foi o responsável pela criação de atividades elogiadas, como os projetos Acústicos no MAM e o MAM Abraça as Crianças. Esse último que chegou a receber até 1.500 pessoas por edição, oferecendo mesas de oficinas de cerâmicas, pintura e colagem para crianças. Zivé lembra que no total foram realizados 30 edições do projeto. “Foram 40 mil pessoas que nunca estiveram no MAM, de todas as classes sociais. Pessoas que não tinham o sentimento de pertencimento com o lugar”, conta.

Pensando na ausência da Bienal da Bahia, a gestão de Zivé também decidiu criar o projeto Estado Bienal. Foi uma forma para que o público, artistas e curadores pudessem continuar no ímpeto de perpetuar as ideias de uma bienal. Entre as muitas exposições realizadas na gestão do artista, o MAM foi palco para obras de artistas como Volpi e outros escultores contemporâneos brasileiros.

No início de 2019, Zivé é demitido do museu, ainda com as reformas pensadas por Solange Farkas e modificadas por ele, incompletas. No seu lugar entra a historiadora Tereza Lino, que consegue ver as reformas chegarem a um “fim” — o segundo andar do casarão, o restaurante e o atracadouro ainda não foram concluídos. A passagem de Lino no MAM, no entanto, foi rápida. Tentamos contato com a historiadora, mas ela preferiu não comentar.

O museu passou a receber festas de grupos como Psirico, Saulo Fernandes e Jau, além da gravação de um DVD da banda Forró do Tico, festas essas do qual a gestora não concordava, mas que eram autorizados pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural do Estado da Bahia (Ipac), que desde 2003 passa a administrar os museus do estado. Esse impasse fez com que ela pedisse demissão em novembro de 2019. Até o momento, quase nove meses depois, o museu ainda não encontrou seu novo diretor.

No aniversário de 60 anos do museu, no último dia 6 de janeiro, nenhuma nota foi emitida para o público. Curiosamente, no dia do aniversário do equipamento cultural, as redes sociais do MAM e Ipac publicaram o flyer de um show do cantor Luan Santana. Na mesma semana, o show, que já tinha seus ingressos à venda, foi vetado por determinação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

O acervo e os artistas
Atualmente fechado em decorrência da pandemia do novo coronavírus, o MAM conta com uma visita virtual às exposições Salvador do povo, de Lina, de Todos os Santos, na Capela, e Cores, Amores, Recantos… Bahia, no Casarão. Essas exposições estavam em cartaz antes do fechamento obrigatório. Por se tratar de espaços de convergência e convivência, a coordenadora museóloga do museu, Sandra Regina, acredita que o retorno das atividades precisará ser gradual. “Inicialmente com poucos visitantes, evitando as possíveis aglomerações, limitando o número de visitantes dentro dos espaços expositivos, garantindo o distanciamento deles no interior das salas”, conta.

Sandra, que começou como estagiária na então Subgerência de Museologia do MAM em 2005, desde 2009 passou a coordenar o Núcleo de Museologia, cargo que ocupa até os dias atuais. É dela a função de pesquisar dentro do acervo histórico documental, coordenar as montagens e desmontagens de exposições, fazer o acompanhamento museológico das obras do acervo do MAM em empréstimo a outras instituições, dentre outras atividades.

Segundo ela, atualmente o MAM possui cerca de 1.400 obras das mais variadas linguagens artísticas em seu acervo. Ela conta que notadamente as obras de Arte Moderna são as mais reconhecidas: “O Touro, de Tarsila do Amaral, é uma das principais dentro da coleção dos modernistas brasileiros”. Na coleção do acervo ainda encontram-se obras de Di Cavalcanti, Cândido Portinari, Pierre Verger, Rubem Valentim, Carybé, Mário Cravo Jr., Mestre Didi, Juarez Paraíso, Almandrade, J. Cunha, Mario Cravo Neto, Bel Borba, Caetano Dias, Márcia Abreu, Juraci Dórea, Marepe, Sante Scaldaferri, Maria Célia Amado, Yedamaria e outros.

O artista Almandrade destaca que o acervo do MAM possui uma importância não só pra Bahia, mas para o Brasil e até fora do país. “É preciso de uma gestão não só para abrir o espaço para o público, mas também para cuidar desse acervo”, pontua. “Você não tem uma continuidade administrativa. Você muda de administração e isso muda tudo, isso acontece em todas as instituições do estado e do município. Tem que ter uma programação didática, você tem que formar olhar, educar o olhar da população para o museu”, acrescenta o artista.

Tem que ter uma programação didática, você tem que formar olhar, educar o olhar da população para o museu

Almandrade, artista

“O museu abriga uma belíssima coleção, valiosíssima para história da arte brasileira, e do mundo, com obras de artistas contemporâneos”, comenta o artista Caetano Dias. “Temos esse arquivo de Arte Modernista e de Arte Contemporânea também, mas antes de tudo tínhamos a produção de conhecimento, produção de reflexão, e agora parece que independentemente dessa questão circunstancial do coronavírus, parece que se perdeu importância, parece que as pessoas não percebem o quanto é importante a relação do MAM com o pensamento, com o sensível, e isso me entristece muito e a todos nós que estamos ligados a arte”, finaliza.

Em conversa com a Sobrado, o diretor do Ipac, João Carlos de Oliveira, conta que o museu está preparando uma nova exposição virtual, em 360º, no mesmo modelo da que hoje está disponível e revela que pretende expandir a ideia para outros museus do estado. O retorno dos museus, no entanto, ainda deve demorar. Estamos numa pandemia e, como foi citado pela museóloga Sandra Regina, esse tipo de atividade terá um retorno gradual.

João Carlos acredita que ainda devem demorar 40 a 50 dias para se pensar no retorno dos museus. “Os equipamentos culturais, eventos, eles são o último da fila do movimento de reabertura. E a gente tem uma discussão sobre protocolos e demais demandas que ainda está sendo feita internamente no âmbito do governo, para a gente enxergar os protocolos de reabertura”, conta o gestor. “O MAM tem todas aquelas áreas externas, tem a Capela, agora tem o cinema, o café… Então, assim, se você for pensar, não é simplesmente abrir exposição, temos que pensar a abertura do equipamento com essa complexidade, né?”, completa.

O diretor do Ipac também conta que o edital para o restaurante do museu foi lançado há mais de quatro meses, apesar de não ter uma previsão de quando deve inaugurar. Assim como o atracadouro, que segundo ele está em situação avançada de finalização.

Sobre as reclamações da ausência de oficinas, ele revela que foi feito uma captação via lei Rouanet garantindo 10 meses de formação, dando destaque para que 10% do público seja formado por pessoas da comunidade do Solar do Unhão. “Íamos começar agora, já está tudo assinado”, garante João Carlos.

Ao ser perguntado sobre a cadeira vazia na direção do museu, o gestor do Ipac afirma que ainda não possui um nome para o cargo, mas que isso está sendo pensado no momento. “Isso está sendo feito com cuidado”, afirma. No entanto, não há um prazo para a divulgação desse nome.